quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

O FIO DE ARIADNE - SEGUNDA EDIÇÃO



                                    BookCoverPreview - 2ª edição O FIO DE ARIADNE


Lançada a segunda edição revista de O FIO DE ARIADNE, trazendo junto consigo o lançamento do meu selo editorial.
Disponível em formato papel e kindle. Acesse:
www.amazon.com/s/ref=nb_sb_ss_i_0_9?url=search-alias%3Daps&field-keywords=leonia+oliveira&sprefix=leonia+ol%2Caps%2C717

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

FANFARRAS, PÍFAROS E CONTRABAIXOS



Meu coração é uma fanfarra
Com seus chocalhos e repiques,
Cornetas que alardeiam minhas faces
E zabumbas que trovejam a minha voz
Em cantos doces, em caixas de guerra,
Em pratos e surdos.
Ele não desfila em serviços militares,
Nem faz as honras em comemorações cívicas,
Cambaleoteia tocando e fazendo coreografias,
Mas ao simples apito do guarda de trânsito,
Descompassa.

Meu coração é uma banda de pífaros
Com sete orífícios circulares
Bombando músicas e poemas
E também a prosa em trocadilho
Com o tarol e se alguém canta uma canção nefasta
Se algum badalo de gado soa,
Meu coração descompassa.

Meu coração é uma orquestra sinfônica
E sente todos os holofotes,
De todos os instrumentos da orquestra é
Mais meu coração o holofote
Que empresta a luz para mostrar a orquestra.
Uma luz solista, de violinos e pianos,
De que valeria a orquestra sem que uma luz
Lhe fosse o dínamo da apresentação em noite de gala?
Meu coração maestro também
Não sabe viver sem que lhe dirijam os holofotes
E se alguém ameaça redirecionar a luz
Meu coração distoa.

Meu coração é a bateria de uma escola de samba,
Um imenso mar de ritmos e também
É o samba enredo e o carnavalesco
Que constrói os mitos
Que projeta estrelas
Por uma noite,
Embora a madrinha desta bateria não veja que só existe por que meu coração
Traz o enredo, o samba, o ritmo
Se alguém colocar algum obstáculo para alcançá-la,
Meu coração erra na paradinha
E o samba desanda. 
De que servirão os adereços das estrelas, então, nos outros dias?

De fato, meu coração não é mais que uma banda de Jazz
E só sabe tocar uma música,
Toca em todos os tons de jazz a mesma música
E todos pensam se tratar de músicas diferentes,
Mas é a mesma.
Ele tem a fidelidade do meu nome.Uma fidelidade leonina.

Meu coração tem medo que lhe tirem o som
Que lhe acordem,
Que lhe digam que um coração não pode ser
Uma fanfarra, uma orquestra, uma harmonia,
Que consigam lhe provar esta impossibilidade.
Penso mesmo que ele projeta um mundo
E como não sabe falar 
Empresta-me esta  poesia para explicá-lo.

Esta poesia dói, porque meu coração é um trio de chorinho neste momento.
Pode-se notar os cortes que nele se abrem e a vontade que ele tem
De continuar fornecendo luz,
De ser o neon do cavaquinho,
E a vontade que ele tem de apagar a luz,
Porque sabe como encerrar o show.

E ele, é bom que se diga,  empresta sons
E consegue anulá-los se se sentir usado.


Acho que meu coração é um contrabaixo.

©leoniaoliveira

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

TRIGO


Eu sou o trigo
E canto uma canção selvagem.
Nasço aonde nasce o pão
Que se consome
E eu não pedi
Para que descobrissem meu sabor.
Nesta geração de trigais
 Nenhum sabe como meu sabor
Foi descoberto
Como e por quem.
Quem de fato provou o primeiro grão de trigo,
De onde veio,  se já estava aqui.
Eu sou o trigo
E canto uma canção selvagem
Enquanto o vento passa pelos trigais,
Uma canção assim de tristeza por ter sido domesticado
E servir agora para ser o pão, a massa, a farinha e a rosca.

Eu sou o trigo e eu sou o ceifador
Canto assim uma canção de posse,
De foice,
De escada,
De martelo,
De corda amarrando o feixe.
Que pode o trigo contra o ceifador?
Melhor ser o trigo e o ceifador
E sendo os dois, ser um só,
Aquele que se ceifa e se enfaixa
E não se importa muito com as botas ou com as mãos
Com os riscos criados pelos cortes nas mãos
Sem luvas e sem cuidados
Eu sou o trigo e o ceifador
Por isso sei a dor do trigo
E sei a fome do ceifador
A força que há na ceifeira
O lenço molhado de suor sob o chapéu.

Eu sou o trigo e sou o forno
E canto uma canção de amor
Quando moído, massacrado e estendido,
Colocam-me a fazer a massa
A fazer a massa de fazer o pão.
Sendo forno e sendo trigo
Sofro da mesma canção.
E assim achamos bonito
Alimentar os que nos queimam e moem
E dilaceram nossa existência
Por conta de sua fome,
De sua gula,
De suas receitas
Aonde nos precisam e nos querem enfiar.
Eu sou o trigo e sou o forno
E canto uma canção de amor
E nem me lembro de onde vim
Que era livre e selvagem
E fui domesticado como um cão.
Não sei quem fez isto
E o forno não sabe quem lhe deu tal feitio de caverna agrária.
Por isso esta canção que cantamos é um fado
De além-terra, além-planeta, além-galáxia,
Pensamos que podemos ser de outra natureza,
Criados em outra civilização,
Que fomos imputados a este convívio
Dos que precisam do trigo e do forno
Para lhes fazer o pão.

Eu sou o trigo e eu sou o pão
E canto uma canção de inventário:
Saciada a fome o faminto nem se recorda
De haver ingerido trigo ou pão.
O faminto não conhece a inteligência do trigo
Muito menos as conversas entre o trigo, a foice e o forno.
Imagina que não fosse a sua fome
Não haveria utilidade para o trigo.
Eu sou o trigo e eu sou o pão
E canto uma canção de inventário
Narrando tudo à natureza.
Narro minha história a mim mesmo
E súbito me surpreendo por conhecer minha genética
E os modelos do meu DNA,
Por saber como alterá-los
De forma a fazer com que o faminto
Nunca mais encontre trigo e pão.

Eu sou o trigo
E se assim o fizer
Que achem outro grão.
Canto uma selvagem canção de amor:
Não me é importante ser necessário, porque sou necessário.
Porque me elegeram a este grau
E me relegam achando-se necessários para mim.
Se me decodifico estão libertos a foice, o forno e a massa,
E toda comitiva que transita ao redor da colheita à mesa.
E o faminto não terá mais meu grão.

Eu sou o trigo
Eu sou o pão.

©leoniaoliveira all rights reserved in TRIGO)